CHRYSALIDAS CHRYSALIDAS POESIAS DE MACHADO DE ASSIS COM UM PREFACIO DO DR. CAETANO FILGUEIRAS. B.L.G. RIO DE JANEIRO LIVRARIA DE B. L. GARNIER Rua do Ouvidor, 69. 1864 TYP. DE QUIRINO & IRMÃO rua da Assembléa, 54. A’ MEMORIA DE Francisco José de Assis E Maria Leopoldina Machado de Assis MEUS PAES. O POETA E O LIVRO Conversação preliminar. I. Ha dez annos!... sim... dez annos!!... Como resvala o tempo sobre a face da terra? Eramos sempre cinco, — alguma vez sete: O mavioso rouxinol das Primaveras. O mellifluo cantor das Esperanças. O inspirado autor das Tentativas. O obscuro escriptor destas verdades. O quinto era um menino... uma verdadeira creança: não tinha nome, e posto que hoje todos lh’o conheçam, não me convem a mim dizê-lo neste lugar, e tão cedo. II. Pago o quotidiano tributo á existencia material; satisfeitos os deveres de cada profissão, a palestra litteraria nos reunia na faceira e tranquilla salinha do meu escriptorio. Alli, — horas inteiras,— alheios ás lutas do mundo, conchegados nos lugares e nas affeições, levitas do mesmo culto, filhos dos mesmos paes — a pobreza e o trabalho,— em derredor do altar do nosso templo — a meza do estudo... fallavamos de Deos, de amor, de sonhos; conversavamos musica, pintura, poesia!... Alli depunhamos o fructo das locubrações da vespera, e na singella festa das nossas crenças, novas inspirações bebiamos para os trabalhos do seguinte dia. Era um continuo deslisar de amenissimos momentos; era um suave fugir das murmurações dos profanos; era emfim um dulcissimo viver nas regiões da phantasia!... E foi esse o berço das Primaveras, das Tentativas, das Chrysalidas e das Ephemeras, e foi d'alli que irradiaram os nomes de Casimiro de Abreu, de Macedinho, de Gonsalves Braga, e com splendido fulgor o de Machado de Assis! A morte e o tempo derribaram o altar, e dispersaram os levitas. Do templo só resta o chão em que se ergueu; e dos amigos só ficaram dous... dous para guardar, como Vestaes severas, o fogo sagrado das tradições d'aquelles dias, e para resumir no profundo affecto que os liga, o laço que tão fortemente estreitava os cinco. E no instante em que este livro chegar ás mãos do primeiro leitor, as campas delles, — diz-m'o o coração,— se entreabrirão para receber o saudoso suspiro dos irmãos, e um raio sympathico da aureola do poeta! III. Eramos, pois, cinco. Liamos e recitavamos. Denunciavamos as novidades: zurziamos as profanações: confundiamos nossas licções: — segredavamos nossos amores! O quinto, — o menino, — depunha, como todos nós, sua respectiva off’renda. Balbuciando apenas a litteratura, — ainda novo para os seus mysterios, ainda fraco para o seu peso, nem por isso lhe faltava ousadia; antes sobrava-lhe soffreguidão de saber, ambição de louros. Era vivo, era trefego, era trabalhador. Aprazia-me de ler-lhe no olhar movel e ardente a febre da imaginação; na constancia das producções a avidez do saber, e combinando no meu espirito estas observações com a naturalidade, o colorido e a luz de conhecimentos litterarios que elle, — sem querer sem duvida, — derramava em todos os ensaios poeticos que nos lia, dediquei-me a estuda-lo de perto, e convenci-me, em pouco tempo, de que largos destinos lhe promettia a musa da poesia… E por isso quando, lida alguma composição do nosso joven companheiro, dizião os outros: bons versos! mas simplesmente — bom versos, — eu nunca deixava de accrescentar, cheio do que affirmava: — bello prenúncio de um grande poeta! IV. Correram os annos... e como se a seiva dos ramos perdidos se houvesse concentrado no renovo que ficára, o renovo cresceu, cresceu e vigorou! A prophecia se foi todos os dias realisando de um modo brilhante. Hoje a criança é homem; — o aprendiz jornalista e poeta. Não me enganára... Adivinhei-o! E se alguem descobrir em mim vaidade quando me attribuo positivamente o privilegio e a autoridade desta prophecia, declaro desde já que a não declino, que a quero para mim, que a não cedo a ninguem, porque... porque della me prézo, porque della me orgulho, porque o prophetizado é Machado de Assis, — o bardo de Corina, — o poeta das Chrysalidas! V. Até aqui o amigo: agora, leitor! o critico. Eu disse: — o poeta das Chrysalidas. Poeta é o autor: Chrysalidas é o livro. Chrysalidas e poeta... dous lindos nomes... dous nomes sonoros... mas um delles falso! Como serpe entre rosas, — no meio de tanta consonancia deslisou-se uma contradicção. Chrysalida é nympha, é principio de transformação, aurora de existencia, semente de formosura… e os versos de Machado de Assis são gemmas scintillantes, vida espalmada, flores e sorrisos. Na mortalha informe e incolor do casulo a graça está em problema, o movimento em risco: os versos de Machado de Assis só guardaram de nympha a belleza e o dom da aeredade! São fulgidas borboletas que adejão sobre todas as flores d'alma, revelando a quem as contempla a perfeição da creatura e o genio do creador. Não são, pois, chrysalidas; se o fossem não seria o autor poeta, e Machado de Assis, leitor, é poeta! Falla-vos o coração de quem vo-lo diz? Não: protesta unicamente a consciencia, e juro-o por minha fé de homem de lettras! VI. A que eschola pertence o autor deste livro ? A’ mystica de Lamartine, á sceptica de Byron, á philosophica do Hugo, á sensualista de Ovidio, á patriotica de Mickiewicz, á americana de Gonsalves Dias? A nenhuma. Qual o systema metrico que adoptou? Nenhum. Qual a musa que lhe preside ás creações ?.. A mythologica de Homero, a mixta de Camões, a catholica do Dante, a libertina de Parny? Nenhuma. A eschola de Machado de Assis é o sentimento; — seu systema a inspiração: sua musa a liberdade. Triplice liberdade: liberdade na concepção; liberdade na forma; liberdade na roupagem. Triplice vantagem: — originalidade, naturalidade, variedade! Sua alma é um cadinho onde se apurão effluvios derramados pela natureza: Produz versos como a harpa Eolia produsia sons: — canta e suspira como a garganta do valle em noites de verão; pinta e descreve, como a face espelhada da lagôa o Céu dos nossos sertões. E não lhe pergunteis porque: não saberia responder-vos. Se insistisseis... parodiar-vos-hia a epigrafe da sua — Sinhá —, o versiculo do Cantico dos Canticos, e no tom da maior ingenuidade, dir-vos-hia: — a minha poesia... é como o oleo derramado! E com razão... por que Machado de Assis é a lyra, a natureza o plectro. E da amphora de sua alma elle mesmo ignora quando trasbordão as gottas perfumadas! VII. Eis aqui, pois, como Machado de Assis é poeta. Um Deus benigno,— o mesmo que lhe deu por patria este solo sem igual, — deu-lhe tambem o condão de reflectir a pomposa natureza que o rodeia. Fez mais.... medio por ella esse condão. Se tivera nascido á sombra do polo, entre os gelos do norte, seus canticos pallidos e frios traduzirião em silvos os extases do poeta;— mas filho deste novo Eden, cercado de infinitas maravilhas, as notas que elle desprende são afinadas pelas grandiosas harmonias que proclamão. E' assim duas vezes instrumento... e nesta doce correspondencia entre a creatura e o creador, a Musa ales, o sagrado mensageiro que une a terra e o Céo é... a inspiração!... E' ella que ferve, e derrama da amphora o oleo perfumado. E' ella que marca o compasso ao rythmo, e a eschola ao trovador. E' ella que lhe diz: canta, chora, ama, sorri.... E' ella emfim que lhe segreda o thema da canção, e caprichosa, ora chama-se luz, mel, aroma, graça, virtude, formosura, ora se chama Stella, Visão, Erro, Sinhá, Corinna! VIII. Livres, sentidos, inspirados, os versos do autor das Chrysalidas são e devem ser eloquentes, harmoniosos e exactos. São — porque ninguem se negará a dize-lo lendo-os. Devem ser — porque o sentimento e a inspiração constituem a verdadeira fonte de toda a eloquência o de toda a harmonia no mundo moral, e porque a exactidão é o mais legitimo fructo do consorcio destas duas condições. E' um erro attribuir exclusivamente á arte, a bôa medição do verso. E’ erro igual ao do que recusa ao ignorante de musica, ao dilettanti, a possibilidade de cantar com justeza e expressão. Um verso mal medido é um verso dissonante; é um verso que destaca d'entre seus companheiros como a nota desafinada resalta da torrente de uma escala. N'um e n'outro caso a intelligencia atilada pelo gosto, e o ouvido apurado pela licção — arrancão sem soccorro da arte o joio que nascera no meio do trigo, e embora a ella recorrão para a perfeição da nova planta, nem por isso deixa esta de passar-lhes pela joeira. IX. Para o poeta de sentimento a inspiração brota das bellezas da natureza, como se elevão os vapores da superficie da terra; mais do valle do que da montanha; mais d'aqui do que d'alli. A natureza tambem tem altos e baixos para inspiração. O crepusculo, e mesmo o diluculo, é mais inspirativo que a luz meridiana: — o magestoso silencio da floresta mais do que o frenetico bulicio da cidade: — o vagido mais do que as cans. A poesia que traduz a inspiração, e o verso que photographa a poesia devem portanto ressentir-se destas differenças. Porisso não ha livro de bom poeta que não comprove esta verdade. Não é o talento que afrouxa ou dorme como Homero: é a inspiração que varia. Nas menos inspiradas subsiste ainda o engenho, e o engenho é muito. No livro que vamos folhear, talvez julgueis commigo que poucas composições se aproximão da altura em que o poeta collocou a Visio e os alexandrinos a Corinna. Como não havia de ser assim? Machado de Assis reflectio a natureza, e a natureza só creou uma Corinna! X. Entre a poesia — arte — e a poesia — sentimento, — dá-se, sobre muitas, uma grande differença: — a erudição. Como o arrebique que, occultando os vestigios do tempo revela na face remoçada o poder do artista, mas nunca a mocidade, — a erudição derrama sobre os cantos da lyra um verdadeiro fluido galvanizador. A chlamyde romana em que se envolve o poeta lhe dissimula — o vacuo do coração, e o cothurno grego, que por suado esforço conseguio calçar, lhe tolhe, apezar de elegante e rico, a naturalidade dos movimentos. Com demasia de vestidos não é possivel correr bem.... e a poesia deve correr, correr naturalmente como a infancia, como o arroio, como a briza, e até mesmo como o tufão e como a lava! O luxo exagerado da roupagem denotava ante a sabedoria antiga-leviandade de juizo: ante a critica moderna ainda denota na poesia penuria de phantasia. A simplicidade dos modelos Gregos e Hebraicos, que nos legou a litteratura dos primeiros tempos desde então proscreveu para o bom gosto, a pretenciosa licção dos porticos. A facundia academica sempre emmudeceu e atemorisou as almas ingenuas, e nas doces expanções destas, e não nas doutas preleccões d'aquella, colhe a poesia os seus melhores thesouros e os seus mais caros triumphos. No genero de poesia das Chrysalidas, (unico sem duvida de que fallo aqui,) é tão evidente esta verdade, tão clara a primazia conferida pelo gosto litterario ao improviso sobre a arte, ao sentimento sobre a erudição que basta recordar quaes os nomes dos poetas brasileiros ou lusos, que, no meio de tantas e tão variadas publicações, se tornaram e permanecem exclusivamente populares. E para que não vos falte, leitor, um exemplo de notoria actualidade comparae Thomaz Ribeiro a Theophylo Braga, e disei-me — se o brilhante talento do segundo poderá jamais disputar a palma da poesia á divina singeleza do primeiro. Machado de Assis é o nosso Thomaz Ribeiro, mais inspirados, e talvez mais ardente; e como alem de poeta é jornalista guarda a erudição para o jornal… digo mal: não guarda... O cantor de Corinna quando escreve versos não levanta a penna do papel, e por isso a historia nunca depara lugar entre o bioco de uma e a superficie do outro. XI. Seja, porém, qual for vossa opinião sobre tudo quanto acabo de conversar com vosco: seja qual for vosso juizo sobre o modo porque recommendei o livro e o auctor, negai-me embora vosso assentimento, mas concedei-me dous unicos direitos. O primeiro é o de fazer-vos crêr que estas paginas não são mais do que a dupla e sincera manifestação dos sentimentos do amigo e do critico. O segundo é o de asseverar-vos, ainda uma vez, que o livro que ides percorrer é flor mimosa de nossa litteratura e que o poeta hade ser, — sem duvida alguma, — uma das glorias litterarias deste grande Imperio. Na esplendida crusada do futuro, são as Chrysalidas o seu primeiro feito d'armas. Como Bayard a Francisco 1º, a Musa da Poesia armou-o cavalheiro depois de uma victoria! Côrte em 22 de Julho de 1864 Dr. CAETANO FILGUEIRAS. MUSA CONSOLATRIX. (1864.) Que a mão do tempo e o halito dos homens Murchem a flor das illusões da vida, Musa consoladora, E’ no teu seio amigo e socegado Que o poeta respira o suave somno Não ha, não ha comtigo, Nem dor aguda, nem sombrios ermos; Da tua voz os namorados cantos Enchem, povoam tudo De intima paz, de vida e de conforto. Ante esta voz que as dores adormece, E muda o agudo espinho em flor cheirosa, Que vales tu, desillusão dos homens? Tu que pódes, ó tempo? A alma triste do poeta sobrenada A’ enchente das angustias; E, affrontando o rugido da tormenta, Passa cantando, alcyone divina. Musa consoladora, Quando da minha fronte de mancebo A ultima illusão cahir, bem como Folha amarella e secca Que ao chão atira a viração do outono, Ah! no teu seio amigo Acolhe-me, — e terá minha alma afllicta, Em vez de algumas illusões que teve, A paz, o ultimo bem, ultimo e puro STELLA. (1862.) Ouvre ton aile et pars.. Th. Gauthikr. Já raro e mais escasso A noite arrasta o manto, E verte o ultimo pranto Por todo o vasto espaço. Tibio clarão já córa A tela do horisonte, E já de sobre o monte Vem debruçar-se a aurora. A’ muda e torva irmã, Dormida de cansaço, Lá vem tomar o espaço A virgem da manhã. Uma por uma, vão As pallidas estrellas, E vão, e vão com ellas Teus sonhos, coração. Mas tu, que o devaneio Inspiras do poeta, Não vês que a vaga inquieta Abre-te o humido seio? Vai. Radioso e ardente, Em breve o astro do dia, Rompendo a nevoa fria, Virá do roxo oriente. Dos intimos sonhares Que a noite protegera, De tanto que eu vertera Em lagrimas a pares, Do amor silencioso, Mystico, doce, puro, Dos sonhos de futuro, Da paz, do ethereo gozo, De tudo nos desperta Luz. de importuno dia; Do amor que tanto a enchia Minha alma está deserta. A virgem da manhã Já todo o céu domina.... Espero-te, divina, Espero-te, amanhã. LUCIA. (Alf. De Musset. — 1860.) Nós estávamos sós; era de noite; Ella curvára a fronte, e a mão formosa, Na embriaguez da scisma, Tenue deixava errar sobre o teclado; Era um murmurio; parecia a nola De aura longinqua a resvalar nas balsas E temendo accordar a ave no bosque; Em torno respiravam as boninas Das noites bellas as volupias mornas; Do parque os castanheiros e os carvalhos Brando embalavam orvalhados ramos; Ouviamos a noite; entre-fechada, A rasgada janella Deixava entrar da primavera os balsamos; A varzea estava erma e o vento mudo; Na embriaguez da scisma a sós estávamos, E tinhamos quinze annos! Lucia era loura e pallida; Nunca o mais puro azul de um céu profundo Em olhos mais suaves reflectiu-se. Eu me perdia na belleza della, E aquelle amor com que eu a amava — e tanto! — Era assim de um irmão o affecto casto, Tanto pudor nessa creatura havia! Nem um som despertava em nossos labios; Ella deixou as suas mãos nas minhas; Tibia sombra dormia-lhe na fronte, E a cada movimento—na minh'alma Eu sentia, meu Deus, como fascinam Os dous signos de paz e de ventura: Mocidade da fronte E primavera d'alma. A lua levantada em céu sem nuvens Com uma onda de luz veio inundal-a; Ella viu sua imagem nos meus olhos, Um riso de anjo desfolhou nos labios E murmurou um canto. Filha da dôr, ó languida harmonia! Lingua que o genio para amor creára — E que, herdada do céu, nos deu a Italia! Lingua do coração — onde alva idéa, — Virgem medrosa da mais leve sombra, — Passa envolta n'um véu e occulta aos olhos! Que ouvirá, que dirá nos teus suspiros Nascidos do ar, que elle respira — o infante? Vê-se um olhar, uma lagrima na face, O resto é um mysterio ignoto ás turbas, Como o do mar, da noite e das florestas! Estavamos a sós e pensativos. Eu contemplava-a. Da canção saudosa Como que em nós estremecia um éco. Ella curvou a languida cabeça.... Pobre criança! — no teu seio acaso Desdemona gemia? Tu choravas, E em tua boca consentias triste Que eu depuzesse estremecido beijo; Guardou-a a tua dôr ciosa e muda: Assim, beijei-te descorada e fria, Assim, depois tu resvallaste á campa; Foi, como a vida, tua morte um riso, E a Deus voltaste no calor do berço. Doces mysterios do singelo tecto Onde a innocencia habita; Cantos, sonhos d’amor, gozos de infante, E tu, fascinação doce e invencivel, Que á porta já de Margarida,— o Fausto Fez hesitar ainda, Candura santa dos primeiros annos, Onde paraes agora? Paz á tua alma, pallida menina! Ermo de vida, o piano em que tocavas Já não accordará sob os teus dedos! O DILUVIO. (1863). E cahio a chuva sobre a terra quarenta dias e quarenta noites. Genesis — C, VII v. 12. Do sol ao raio esplendido, Fecundo, abençoado, A terra exhousla e humida Surge, revive já; Que a morte inteira e rapida Dos filhos do peccado Poz termo á immensa colera Do immenso Jehovah! Que mar não foi! que tumidas As aguas não rolavam! Montanhas e planicies Tudo tornou-se um mar; E nesta scena lugubre Os gritos que soavam Era um clamor unisono Que a terra ia acabar. Em vão, ó pae atonito, Ao seio o filho estreitas; Filhos, esposos, miseros, Em vão tentaes fugir! Que as aguas do diluvio Crescidas e refeitas, Vão da planicie aos pincaros Subir, subir, subir! Só, como a idéa unica De um mundo que se acaba, Erma, boiava intrepida, A arca de Noé; Pura das velhas nodoas De tudo o que desaba, Leva no seio incolumes A virgindade e a fé. Lá vae! Que um vento aligero Entre os contrarios ventos, Ao lenho calmo e impavido Abre caminho alem... Lá vae! Em torno angustias, Clamores o lamentos; Dentro a esperança, os canticos, A calma, a paz e o bem. Cheio de amor, solicito, O olhar da divindade, Vela os escapos naufragos Da immensa alluvião. Assim, por sobre o tumulo Da extincta humanidade Salva-se um berço: o vinculo Da nova creação. Iris, da paz o nuncio, O nuncio do concerto, Riso do Eterno em jubilo, Nuvens do céu rasgou; E a pomba, a pomba mystica, Voltando ao lenho aberto, Do arbusto da planicie Um ramo despencou. Ao sol e ás brisas tepidas Respira a terra um hausto, Viçam de novo as arvores, Brota de novo a flor; E ao som de nossos canticos, Ao fumo do holocausto Desapparece a colera Do rosto do Senhor. VISIO. (1864). Eras pallida. E os cabellos, Aereos, soltos novellos, Sobre as espaduas cahiam... Os olhos meio-cerrados De volupia e de ternura Entre lagrimas luziam... E os braços entrelaçados, Como cingindo a ventura, Ao teu seio me cingiam… Depois, naquelle delirio, Suave, doce martyrio De pouquíssimos instantes, Os teus labios sequiosos, Frios, tremulos, trocavam Os beijos mais delirantes, E no supremo dos gozos Ante os anjos se cazavam Nossas almas palpitantes… Depois... depois a verdade, A fria realidade, A solidão, a tristeza; Daquelle sonho desperto, Olhei... silencio de morte Respirava a natureza — Era a terra, era o deserto, Fôra-se o doce transporte, Restava a fria certeza. Desfizera-se a mentira: Tudo aos meus olhos fugira; Tu e o teu olhar ardente, Labios tremulos e frios, O abraço longo e apertado, O beijo doce e vehemente; Restavam meus desvarios, E o incessante cuidado, E a phantasia doente. E agora te vejo. E fria Tão outra estás da que eu via Naquelle sonho encantado! E’s outra — calma, discreta, Com o olhar indifferente, Tão outro do olhar sonhado, Que a minha alma de poeta Não vê se a imagem presente Foi a visão do passado. Foi, sim, mas visão apenas; Daquellas visões amenas Que á mente dos infelizes Descem vivas e animadas, Cheias de luz e esperança E de celestes matizes: Mas, apenas dissipadas, Fica uma leve lembrança, Não ficam outras raizes. Inda assim, embora sonho, Mas, sonho doce e risonho, Désse-me Deus que fingida Tivesse aquella ventura Noite por noite, hora a hora, No que me resta de vida, Que, já livre da amargura, Alma, que em dores me chora. Chorára de agradecida! FÉ. (1863.) Mueve-ine enfin tu amor de tal manera Que annqne no hubiera cielo yo te amara. Santa Thereza de Jesus. As orações dos homens Subam eternamente aos teus ouvidos; Eternamente aos teus ouvidos soem Os canticos da terra. No turvo mar da vida, Onde aos parceis do crime a alma naufraga, A derradeira bussola nos seja, Senhor, tua palavra. A melhor segurança Da nossa intima paz, Senhor, é esta; Esta a luz que ha de abrir á estancia eterna O fulgido caminho. Ah! feliz o que pode, No extremo adeus ás cousas deste mundo, Quando a alma, despida de vaidade, Vê quanto vale a terra; Quando das glorias frias Que o tempo dá e o mesmo tempo some, Despida já,— os olhos moribundos Volta ás eternas glorias; Feliz o que nos labios, No coração, na mente põe teu nome, E só por elle cuida entrar cantando No seio do infinito. A CARIDADE. (1861.) Ella tinha no rosto uma expressão tão calma Como o somno innocente e primeiro de uma alma Donde não se afastou ainda o olhar de Deus; Uma serena, graça, uma graça dos césu, Era-lhe o casto, o brando, o delicado andar, E nas azas da brisa iam-lhe a ondear Sobre o gracioso collo as delicadas tranças. Levava pela mão duas gentis creanças. Ia caminho. A um lado ouve magoado pranto. Parou. E na anciedado ainda o mesmo encanto Descia-lhe ás feições. Procurou. Na calçada A’chuva, ao ar, ao sol, despida, abandonada A infancia lacrimosa, a infancia desvalida, Pedia leito e pão, amparo, amor, guarida. E tu, ó Caridade, ó virgem do Senhor, No amoroso seio as creanças tomaste, E entre beijos — só teus — o pranto lhes seccaste Dando-lhes leito e pão, guarida e amor. A JOVEN CAPTIVA. (André Chenier. —1861.) — « Respeita a fouce a espiga que desponta; Sem receio ao lagar o tenro pamparo Bebe no estio as lagrimas da aurora; Joven e bella tambem sou; turvada A hora presente de infortúnio e tedio Seja embora; morrer não quero ainda! De olhos seccos o estoico abrace a morte; Eu choro e espero; ao vendaval que ruge Curvo e levanto a timida cabeça. Se ha dias máus, também os ha felizes! Que mel não deixa um travo de desgosto? Que mar não incha a um temporal desfeito? NO LIMIAR. (1863.) Cahia a tarde. Do infeliz á porta, Onde mofino arbusto aparecia De tronco secco e de folhagem morta, Elle que entrava e Ella que sahia Um instante pararam; um instante Ella escutou o que Elle lhe dizia; — « Que fizeste? Teu gesto insinuante Que lhe ensinou? Que fé lhe entrou no peito Ao mago som da tua voz amante? « Quando lhe ia o temporal desfeito De que raio de sol o mantiveste? E de que flores lhe forraste o leito? » — Ella, volvendo o olhar brando e celeste, Disse: — « Varre-lhe a alma desolada, Que nem um ramo, uma só flor lhe reste! « Torna-lhe, em vez da paz abençoada, Uma vida de dôr e de miseria, Uma morte continua e angustiada. « Essa é a tua missão torva e funerea. Eu procurei no lar do infortunado Dos meus olhos verter-lhe a luz etherea. « Busquei fazer-lhe um leito semeado De rosas festivaes, onde tivesse Um somno sem tortura nem cuidado. « E porque o céu que mais se lhe ennegrece, Tivesse algum reflexo de ventura Onde o cançado olhar espairecesse, « Uma restea de luz suave e pura Fiz-lhe descer á erma phantasia, De mel ungi-lhe o calix da amargura. « Foi tudo vão, — foi tudo van porfia, A ventura não veio. A tua hora Chega na hora que termina o dia. « Entra » — E o virgineo rosto que descora Nas mãos esconde. Nuvens que correram Cobrem o céo que o sol já mal colora. Ambos, com um olhar se comprehenderam. Um penetrou no lar com passo ufano; Outra tomou por um desvio. Eram: Ella a Esperança, Elle o Desengano. QUINZE ANNOS. (1860.) Oh! la fleur de 1'Eden, pourguoi l’as-tu fannée, Insouciant enfant, belle Eve aux blonds cheveux? Alfred de Musset. Era uma pobre criança... — Pobre criança, se o eras! — Entre as quinze primaveras De sua vida cançada Nem uma flor de esperança Abria a medo. Eram rosas Que a douda da esperdiçada Tão festivas, tão formosas, Desfolhava pelo chão. — Pobre criança, se o eras! — Os carinhos mal gozados Eram por todos comprados, Que os affectos de sua alma Havia-os levado á feira, Onde vendêra sem pena Até a illusão primeira Do seu doudo coração! Pouco antes, a candura, Co'as brancas azas abertas, Em um berço de ventura A criança acalentava Na santa paz do Senhor; Para acordal-a era cedo, E a pobre ainda dormia Naquelle mudo segredo Que só abre o seio um dia Para dar entrada a amor. Mas, por teu mal, acordaste! Junto do berço passou-te A festiva melodia Da seducção... e acordou-te! Colhendo as limpidas azas, O anjo que te velava Nas mãos tremulas e frias Fechou o rosto... chorava! Tu, na sede dos amores, Colheste todas as flores Que nas orlas do caminho Foste encontrando ao passar; Por ellas, um só espinho Não te ferio... vás andando... Corre, criança, até quando Fores forçada a parar! Então, desflorada a alma De tanta illusão, perdida Aquella primeira calma Do teu somno de pureza; Esfolhadas, uma a uma, Essas rosas de belleza Que se esvaem como a escuma Que a voga cospe na praia E que por si se desfaz; Então, quando nos teus olhos Uma lagrima buscares, E seccos, seccos de febre, Uma só não encontrares Das que em meio das angustias São um consolo e uma paz; Então, quando o frio spectro Do abandono e da penuria Vier aos teus soffrimentos Juntar a ultima injuria: E que não vires ao lado Um rosto, um olhar amigo Daquelles que são agora Os desvellados comtigo; Criança, verás o engano E o erro dos sonhos teus; E dirás, — então já tarde, — Que por taes gozos não vale Deixar os braços de Deus. SINHÀ. (N’um Album. — 1862.) O teu nome é como o oleo derramado. Salomão..— Cantico dos Canticos. Nem o perfume que espira A flor, pela tarde amena, Nem a nota que suspira Canto de saudade e pena Nas brandas cordas da lyra; Nem o murmurio da veia Que abrio sulco pelo chão Entre margens de alva arêa, Onde se mira e recreia Rosa fechada em botão; Nem o arrulho enternecido Das pombas, nem do arvoredo Esse amoroso arruido Quando escuta algum segredo Pela brisa repetido; Nem esta saudade pura Do canto do sabiá Escondido na espessura, Nada respira doçura Como o teu nome, Sinhá! ERRO. (1860.) Vous Qui des combats du coeur n’aimez que la victoire Et qui revez d'amour, comme on rève de glore, L'oeil fier et non voilé des pleurs George Farcy. Erro é teu. Amei-te um dia Com esse amor passageiro Que nasce na phantasia E não chega ao coração; Nem foi amor, foi apenas Uma ligeira impressão; Um querer indifferente, Em tua presença vivo, Nullo se estavas ausente. E se ora me vês esquivo, Se, como outr'ora, não vês Meus incensos de poeta Ir eu queimar a teus pés, E’ que,— como obra de um dia, Passou-me essa phantasia. Para eu amar-te devias Outra ser e não como eras. Tuas frivolas chimeras, Teu vão amor de ti mesma, Essa pendula gelada Que chamavas coração, Eram bem fracos liames Para que a alma enamorada Me conseguissem prender; Foram baldados tentames, Sahio contra ti o azar, E embora pouca, perdeste A gloria de me arrastar Ao teu carro... Vãs chimeras! Para eu amar-te devias Outra ser e não como eras… LUDOVINA MOUTINHO. Elegia. (1861.) A bondade choremos innocente Cortada em flor que, pela mão da morte, Nos foi arrebatada d'entre a gente. Camões.— Elegias. Se, como outr'ora, nas florestas virgens, Nos fosse dado — o esquife que te encerra Erguer a um galho de arvore frondosa, Certo, não tinhas um melhor jazigo Do que alli, ao ar livre, entre os perfumes Da florente estação, imagem viva De teus cortados dias, e mais perto Do clarão das estrellas. Sobre teus pobres e adorados restos, Piedosa a noite, alli derramaria De seus negros cabellos puro orvalho; A’' borda do teu ultimo jazigo Os alados cantores da floresta Iriam sempre modular seus cantos; Nem lettra, nem lavor de emblema humano, Relembraria a mocidade morta; Bastava só que ao coração materno, Ao do esposo, ao dos teus, ao dos amigos, Um aperto, uma dôr, um pranto occulto, Dissesse: — Dorme aqui, perto dos anjos, A cinza de quem foi gentil transumpto De virtudes e graças. Mal havia transposto da existencia Os dourados umbraes; a vida agora Sorria-lhe toucada dessas flores Que o amor, que o talento e a mocidade A’ uma repartiam. Tudo lhe era presagio alegre e doce; Uma nuvem sequer não sombreava, Em sua fronte, o íris da esperança; Era, emfim, entre os seus a copia viva Dessa ventura que os mortaes almejam, E que raro a fortuna, avessa ao homem, Deixa gozar na terra. Mas eis que o anjo pallido da morte A presentio feliz e bella e pura, E, abandonando a região do olvido, Desceu á terra, e sob a aza negra A fronte lhe escondeu; o fragil corpo Não pôde resistir; a noite eterna Veio fechar seus olhos; Emquanto a alma abrindo As azas rutilantes pelo espaço, Foi engolfar-se em luz, perpetuamente, No seio do infinito; Tal a assustada pomba, que na arvore O ninho fabricou, —se a mão do homem Ou a impulsão do vento um dia abate O recatado asylo,— abrindo o vôo, Deixa os inuteis restos E, atravessando airosa os leves ares, Vai buscar n’outra parte outra guarida. Hoje, do que era inda lembrança resta, E que lembrança! Os olhos fatigados Parecem ver passar a sombra della; O attento ouvido inda lhe escuta os passos; E as teclas do piano, em que seus dedos Tanta harmonia despertavam antes, Como que soltam essas doces notas Que outr'ora ao seu contacto respondiam. Ah! pezava-lhe este ar da terra impura, Faltava-lhe esse alento de outra esphera, Onde, noiva dos anjos, a esperavam As palmas da virtude. Mas, quando assim a flor da mocidade Toda se desfolha sobre o chão da morte, Senhor, em que firmar a segurança Das venturas da terra? Tudo morre: A’ sentença fatal nada se esquiva, O que é fructo e o que é flor. O homem cego Cuida haver levantado em chão de bronze Um edifício resistente aos tempos, Mas lá vem dia, em que, a um leve sopro, O castello se abate, Onde, doce illusão, fechado havias Tudo o que de melhor a alma do homem Encerra de esperanças. Dorme, dorme tranquilla Em teu ultimo asylo; e se eu não pude Ir espargir tambem algumas flores Sobre a lagea da tua sepultura; Se não pude, — eu que ha pouco te saudava Em teu erguer, estrella,— os tristes olhos Banhar nos melancolicos fulgores, Na triste luz do teu recente occaso, Deixo-te ao menos nestes pobres versos Um penhor de saudade, e lá na esphera Aonde approuve ao Senhor chamar-te cedo, Possas tu ler nas pallidas estrophes A tristeza do amigo. ASPIRAÇÃO. A F. X. de Novaes. (1862.) Qu’aperçois-tu, mon ame? Au fond, n'est-ce-pas Dieu? Tu vas à lui……. V. de Laprade. Sinto que ha na minh’alma um vacuo immenso e fundo, E desta meia morte o frio olhar do mundo Não vê o que ha de triste o de real em mim; Muita vez, ó poeta, a dor é casta assim; Refolha-se, não diz no rosto o que ella é, E nem que o revelasse, o vulgo não põe fé Nas tristes commoções da verde mocidade, E responde sorrindo á cruel realidade. Não assim tu, ó alma, ó coração amigo; Nu, como a consciencia, abro-me aqui comtigo; Tu que corres, como eu, na vereda fatal Em busca do mesmo alvo e do mesmo ideal. Deixemos que ella ria, a turba ignara e vã; Nossas almas a sós, como irmã junto a irmã, Em santa communhão, sem carcere, sem veus. Conversarão no espaço e mais perto de Deus. Deus quando abre ao poeta as portas desta vida Não lhe depara o gozo e a gloria apetecida; Tarja de luto a folha em que lhe deixa escriptas A suprema saudade e as dores infinitas. Alma errante e perdida em um fatal desterro, Neste primeiro e fundo e triste limbo do erro, Chora a patria celeste, o fóco, o centro, a luz, Onde o anjo da morte, ou da vida, o conduz No dia festival do grande livramento; Antes disso, a tristeza, o sombrio tormento, O torvo azar, e mais, a torva solidão, Embaciam-lhe n’alma o espelho da illusão. O poeta chora e vê perderem-so esfolhadas Da verde primavera as flores tão cuidadas; Rasga, como Jesus, no caminho das dores, Os lassos pés; o sangue humedece-lhe as flores Mortas alli, — e a fé, a fé mãe, a fé santa, Ao vento impuro e máo que as illusões quebranta, Na alma que alli se vae muitas vezes vacilla… Oh! feliz o que póde, alma alegre e tranquilla, A esperança vivaz e as illusões floridas, Atravessar cantando os longas avenidas Que levam do presente ao secreto porvir! Feliz esse! Esse póde amar, gozar, sentir, Viver emfim! A vida é o amor, é a paz, E’ a doce illusão e a esperança vivaz; Não esta do poeta, esta que Deus nos poz Nem como inutil fardo, antes como um algoz. O poeta busca sempre o almejado ideal... Triste e funesto affan! tentativa fatal! Nesta sede de luz, nesta fome de amor, O poeta corre á estrella, á brisa, ao mar, á flor; Quer ver-lhe a luz na luz da estrella peregrina, Quer-lhe o cheiro aspirar na rosa da campina, Na brisa o doce alento, a voz na voz do mar, O’ inutil esforço! ó improbo lutar! Em vez da luz, do aroma, ou do alento ou da voz, Acha-se o nada, o torvo, o impassivel algoz! Onde te escondes, pois, ideal da ventura? Em que canto da terra, em que funda espessura Foste esconder, ó fada, o teu esquivo lar? Dos homens esquecido, em ermo recatado, Que voz do coração, que lagrima, que brado Do somno em que ora estás te virá despertar? A esta sede de amar só Deus conhece a fonte? Jorra elle ainda além deste fundo horisonte Que a mente não calcula, e onde se perde o olhar? Que azas nos déste, ó Deus, para transpor o espaço? Ao ermo do desterro inda nos prende um laço: Onde encontrar a mão que o venha desatar? Creio que só em ti ha essa luz secreta, Essa estrella polar dos sonhos do poeta, Esse alvo, esse termo, esse mago ideal; Fonte de todo o ser e fonte da verdade, Nós vamos para ti, e em tua immensidade E’ que havemos de ter o repouso final. E’ triste quando a vida, erma, como esta, passa; E quando nos impelle o sopro da desgraça Longe de ti, ó Deus, e distante do amor! Mas guardemos, poeta, a melhor esperança: Succederá a gloria á salutar provança: O que a terra não deu, dar-nos-ha o Senhor! EMBIRRAÇÃO. (A Machado de Assis). A balda alexandrina é poço immenso e fundo, Onde poetas mil, flagello deste mundo, Patinham sem parar, chamando lá por mim. Não morrerão, se um verso, estiradinho assim, Da beira fôr do poço, extenso como elle é, Levar-lhes grosso anzol; então eu tenho fé Que volte um afogado, á luz da mocidade, A ver no mundo secco a secca realidade. Por elles, e por mim, receio, caro amigo; Permitte o desabafo aqui, a sós comtigo, Que á moda fazer guerra, eu sei quanto é fatal; Nem vence o positivo o frivolo ideal; Despotica em seu mando, é sempre fatua e vã, E até da vã loucura a moda é prima-irmã: Mas quando venha o senso erguer-lhe os densos véus, Do verso alexandrino ha de livrar-nos Deus. Deus quando abre ao poeta ás portas desta vida,. Não lhe depara o gozo e a gloria appetecida; E o triste, se morreu, deixando mal escriptas Em verso alexandrino historias infinitas, Vai ter lá n’outra vida insipido desterro, Se Deus, por compaixão, não dá perdão ao erro; Fechado em quarto escuro, á noite não tem luz, E se é cá do meu gosto o guarda que o conduz, Debalde, immerso em pranto, implora o livramento! Não torna a ser, aqui, das Musas o tormento; Castigo alexandrino, eterna solidão, Terá lá no desterro, em prêmio da illusão; Verá queimar, á noite, as rosas esfolhadas, Que a moda lhe offertára, e trouxe tão cuidadas, E ao pé do fogo intenso, ardendo em cruas dores, Verá que versos taes são galhos, não dão flores; Que, lendo-os a pedido, a creatura santa, A paciencia lhe foge, a fé se lhe quebranta, Se vai d’um verso ao fim; depois...treme...vacilla... Dormindo, cahe no chão; mais tarde, já tranquilla, Sonha com verso-verso, e as illusões floridas, Risonhas, vem mostrar-lhe as largas avenidas Que o longo verso-prosa occulta, do porvir! Sonhando, ao menos, póde amar, gozar, sentir, Que um somno alexandrino a deixa ali em paz, Dormir...dormir...dormir...erguer-se,emfim, vivaz, Bradando : « Chloroformio! O genio que te poz, A palma cede ao metro esguio, teu algoz! » E aspiras, vate, assim, da gloria ao ideal? Triste e funesto afan!... tentativa fatal! Nesta sede de luz, nesta fome d'amor, O poeta corre a estrella, á brisa, âo mar, á flor; Quer ver-lhe a luz na luz da estrella peregrina, Quer-lhe o aroma sentir na rosa da campina, Na brisa o doce alento, a voz na voz do mar; O’ inútil esforço! O’ improbo lutar! Em vez da luz, do aroma, ou do alento, ou da voz, O verso alexandrino, o impassivel algoz!... Não cantas a tristeza, e menos a ventura; Que em vez do sabiá gemendo na espessura, mitarás, no canto, o grillo atraz do lar; Mas desse estreito asylo, escuro e recatado, Alegre has de fugir, que erguendo altivo brado, A lyrica harmonia ha de ir-te despertar! Verás de novo aberta a copiosa fonte! Da poesia verás tão lucido o horisonte, Que a mente não calcula, e onde se perde o olhar, Que nas asas do genio, a voar pelo espaço, Da perna sacudindo o alexandrino laço, Has de a mão bemdizer que o soube desatar. Do precipicio foge, e segue a luz secreta, Essa estrella polar dos sonhos do poeta; Mas, n’outro verso, amigo, onde ao mago ideal A musica se ligue, o senso e a verdade; — N’um destes vai-se, a ler, da vida a immensidade Da syllaba primeira á syllaba final! Meu Deus! Esta existencia é transitoria e passa; Se fraco fui aqui, peccando por desgraça; Se já não tenho jus ao vosso puro amor; Se nem da salvação nutrir posso a esperança, Quero em chammas arder, soffrer toda a provança — Ler verso alexandrino... Oh! isso não, Senhor F. X. de Novaes. CLEOPATRÁ. Canto de um escravo. (M.me Emile de Girardin.) Filha pallida da noite, Nome feroz de inclemencia, Sem culto nem reverencia, Nem crentes e nem altar, A cujos pés descarnados... A teus negros pés, ó morte! Só engeitados da sorte Ousam frios implorar; Toma a tua foice aguda, A arma dos teus furores; Venho c’roado de flores Da vida entregar-te a flor; E’ um feliz que te implora Na madrugada da vida, Uma cabeça perdida E perdida por amor. Era rainha e formosa, Sobre cem povos reinava, E tinha uma turba escrava Dos mais poderosos reis; Eu era apenas um servo, Mas amava-a tanto, tanto, Que nem tinha um desencanto Nos seus desprezos crueis. Vivia distante della Sem fallar-lhe nem ouvil-a; Só me vingava em seguil-a Para a poder contemplar; Era uma sombra calada Que occulta força levava, E no caminho a aguardava Para saudal-a e passar. Um dia veio ella ás fontes Ver os trabalhos... não pude, Fraqueou minha virtude, Cahi-lhe tremendo aos pés. Todo o amor que me devora, O’ Venus, ó intimo peito, Fallou naquelle respeito, Fallou naquella mudez. Só lhe conquistam amores O heroe, o bravo, o triumphante; E que corôa radiante Tinha eu para offerecer? Disse uma palavra apenas Que um mundo inteiro continha: — Sou um escravo, rainha, Amo-te e quero morrer. E a nova Isis que o Egypto Adora curvo e humilhado O pobre servo curvado Olhou languida a sorrir; Vi Cleopatra, a rainha, Tremer pallida em meu seio; Morte, foi-se-me o receio, Aqui estou, podes ferir. Vem! que as glorias insensatas Das convulsões mais lascivas, As phantasias mais vivas, De mais febre e mais ardor, Toda a ardente ebriedade Dos seus reaes pensamentos, Tudo gozei uns momentos Na minha noite de amor. Prompto estou para a jornada Da estancia escura e escondida; O sangue, o futuro, a vida Dou-te, ó morte, e vou morrer; Uma graça unica — peço Como ultima esperança: Não me apagues a lembrança Do amor que me fez viver Belleza completa e rara Deram-lhe os numes amigos; Escolhe dos teus castigos O que infundir mais terror, Mas por ella, só por ella Seja o meu padecimento, E tenha o intenso tormento Na intensidade do amor. Deixa alimentar teus corvos Em minhas carnes rasgadas, Venham rochas despenhadas Sobre meu corpo rolar, Mas não me tires dos labios Aquelle nome adorado, E ao meu olhar encantado Deixa essa imagem ficar Fosso soffrer os teus golpes Sem murmurar da sentença; A minha ventura é immensa E foi em ti que eu a achei; Mas não me apagues na fronte Os sulcos quentes e vivos Daquelles beijos lascivos Que já me fizeram rei. OS ARLEQUINS. Satyra. (1864.) Que deviendras dans Péternité l’âm e d'un homme qui a fait Polichinelle toute sa vie? M.me de Stael. Musa, depõe a lyra! Cantos de amor, cantos de gloria esquece! Novo assumpto apparece Que o genio move e a indignação inspira. Esta esphera é mais vasta, E vence a letra nova a letra antiga! Musa, toma a vergasta, E os arlequins fustiga! Como aos olhos de Roma, — Cadaver do que foi, pavido imperio De Caio e de Tiberio, — O filho de Agripina ousado assoma; E a lyra sobraçando, Ante o povo idiota e amedrontado, Pedia, ameaçando, O applauso acostumado; E o povo que beijava Outr’ora ao deus Calligula o vestido, De novo submettido Ao regio saltimbanco o applauso dava. E tu, tu não te abrias, O’ céu de Roma, á scena degradante! E tu, tu não cahias, O’ raio chammejante! Tal na historia que passa Neste de luzes seculo famoso, O engenho portentoso Sabe illudir a nescia populaça; Não busca o mal tecido Canto de outr’ora; a moderna insolencia Não encanta o ouvido, Fascina a consciência! Vêde; o aspecto vistoso, O olhar seguro, altivo e penetrante, E certo ar arrogante Que impõe com apparencias de assombroso; Não vacilla, não tomba, Caminha sobre a corda firme e alerta: Tem comsigo a maromba E a ovação é certa. Tamanha gentileza, Tal segurança, ostentação tão grande, A multidão expande Com ares de legitima grandeza. O gosto pervertido Acha o sublime neste abatimento, E dá-lhe agradecido O louro e o monumento. Do saber, da virtude, Logra fazer, em premio dos trabalhos, Um manto de retalhos Que a consciencia universal illude. Não cora, não se peja Do papel, nem da mascara indecente, E ainda inspira inveja Esta gloria insolente! Não são contrastes novos; Já vem de longe; e de remotos dias Tornam em cinzas frias O amor da patria e as illusões dos povos. Torpe ambição sem pêas De mocidade em mocidade corre, E o culto das idéas Treme, convulsa e morre. Que sonho apetecido Leva o animo vil a taes emprezas? O sonho das baixezas: Um fumo que se esvae e um vão ruido; Uma sombra illusoria Que a turba adora ignorante e rude; E a esta infausta gloria Immola-se a virtude. A tão extranha liça Chega a hora por fim do encerramento, E lá sôa o momento Em que reluz a espada da justiça. Então, musa da historia, Abres o grande livro, e sem detença A’ invilecida gloria Fulminas a sentença. EPITAPHIO DO MEXICO. (1862). Caminhante, vai dizer aos Lacedemonios que estamos aqui deitados por termos defendido as suas leis. Epitaphio das Thermopylas. Dobra o joelho: — é um tumulo. Em baixo amortalhado Jaz o cadaver tepido De um povo aniquilado; A prece melancolica Resa-lhe em torno á cruz. Ante o, universo atonito Abrio-se a extranha liça, Travou-se a luta fervida Da força e da justiça; Contra a justiça, ó seculo, Venceu a espada e o obuz. Venceu a força indomita; Mas a infeliz vencida A magoa, a dôr, o odio, Na face invillecida Cuspiu-lhe. E a eterna macula Seus louros murchará. E quando a voz fatidica Da santa liberdade Vier em dias prosperos Clamar á humanidade, Então revivo o Mexico Da campa surgirá. POLONIA. (1862.) E ao terceiro dia a alma deve voltar ao corpo, e a nação resuscitará. Miçkiewiez — Livro da nação polaca. Como aurora de um dia desejado, Clarão suave o horisonte innunda. E’ talvez amanhã. A noite amarga Como que chega ao termo; e o sol dos livres, Cançado de te ouvir o inutil pranto, Alfim resurge no dourado Oriento. Eras livre, — tão livre como as aguas Do teu formoso, celebrado rio; A corôa dos tempos Cingia-te a cabeça veneranda; E a desvellada mãi, a irmã cuidosa, A santa liberdade, Como junto de um berço precioso, A’ porta dos teus lares vigiava. Eras feliz demais, demais formosa; A sanhuda cobiça dos tyranos Veio enluctar teus venturosos dias... Infeliz! a medrosa liberdade Em face dos canhões espavorida Aos reis abandonou teu chão sagrado; Sobre ti, moribunda, Viste cahir os duros oppressores: Tal a gazella que percorre os campos, Se o caçador a fere, Cahe convulsa de dôr em mortaes ancias, E vê no extremo arranco Abater-se sobre ella Escura nuvem de famintos corvos. Presa uma vez da ira dos tyranos, Os membros retalhou-te Dos senhores a explendida cobiça; Em proveito dos reis a terra livre Foi repartida, e os filhos teus — escravos — Viram descer um véu de luto á patria E apagar-se na historia a gloria tua. A gloria, não! — E’ gloria o captiveiro Quando a captiva, como tu, não perde A alliança de Deus, a fé que alenta, E essa união universal e muda Que faz communs a dôr, o odio, a esperança. Um dia, quando o calix da amargura, Martyr, até ás fezes esgotaste, Longo tremor correu as fibras tuas; Em teu ventre de mãi, a liberdade Parecia-sol lar esse vagido Que faz rever o céu no olhar materno; Teu coração estremeceu; teus labios Tremulos do anciedade e de esperança, Buscaram aspirar a longos tragos A vida nova nas celestes auras. Então surgiu Kosciusko; Pela mão do Senhor vinha tocado; A fé no coração, a espada em punho, E na ponta da espada a torva morte, Chamou aos campos a nação cahida. De novo entre o direito e a força bruta Empenhou-se o duello atroz e infausto Que a triste humanidade Inda verá por seculos futuros. Foi longa a luta; os filhos dessa terra Ah! não pouparam nem valor nem sangue! A mãi via partir sem pranto os filhos, A irmã o irmão, a esposa o esposo, E todas abençoavam A heroica legião que ia á conquista Do grande livramento. Coube ás hostes da força Da pugna o alto premio; A oppressão jubilosa Cantou essa victoria de ignominia; E de novo, ó captiva, o véu de luto Correu sobre teu rosto! Deus continha Em suas mãos o sol da liberdade, E inda não quiz que nesse dia infausto Teu macerado corpo allumiasse. Resignada á dôr e ao infortunio, A mesma fé, o mesmo amor ardente Davam-te a antiga força. Triste viuva, o templo abriu-te as portas; Foi a hora dos hymnos e das preces; Cantaste a Deus; tua alma consolada Nas azas da oração aos céus subia, Como a refugiar-se e a refazer-se No seio do infinito. E quando a força do feroz cossaco A’ casa do Senhor ia buscar-te, Era ainda resando Que te arrasta vas pelo chão da egreja. Pobre nação! — é longo o teu martyrio; A tua dôr pede vingança e termo; Muito has vertido em lagrimas e sangue; E’ propicia esta hora. O sol dos livres Como que surge no dourado Oriente. Não ama a liberdade Quem não chora comtigo as dôres tuas; E não pede, e não ama, c não deseja Tua resurreição, finada heroica! AS ONDINAS. (Nocturno de H. Heine.) Beijam as ondas a deserta praia; Cahe do luar a luz serena e pura; Cavalleiro na arêa reclinado Sonha em hora de amor e de ventura. As ondinas, em nivea gase envoltas, Deixam do vasto mar o seio enormer: Tímidas vão, acercam-se do moço, Olham-se e entre si murmuram: « Dorme! » Uma — mulher emfim — curiosa palpa De seu penacho a pluma fluctuante; Outra procura decifrar o motte Que traz escripto o escudo rutilante. Esta, risonha, olhos de vivo fogo, Tira-lhe a espada limpida e lustrosa, E apoiando-se nella, a contemplal-a Perde-se toda em extasi amorosa. Fita-lhe aquella namorados olhos, E após girar-lhe em torno embriagada, Diz: « Que formoso estás, ó flor da guerra, Quanto te eu dera por te ser amada! » Uma, tomando a mão ao cavalleiro, Um beijo imprime-lhe: outra, duvidosa, Audaz por fim, a boca adormecida Casa n'um beijo á boca desejosa. Faz-se de sonso o joven; caladinho Finge do somno o placido desmaio, E deixa-se beijar pelas ondinas Da branca lua ao doce e brando raio. MARIA DUPLESSIS. (Al. Dumas Filho. —1859.) Fiz promessa, dizendo-te que um dia Eu iria pedir-te o meu perdão; Era dever ir abraçar primeiro A minha doce e ultima affeição. E quando ia apagar tanta saudade Encontrei já fechada a tua porta; Soube que uma recente sepultura Muda fechava a tua fronte morta. Soube que, apoz um longo soffrimento, Aggravára-se a tua enfermidade; Viva esperança que eu nutria ainda Despedaçou cruel fatalidade. Vi, apertado de fataes lembranças, A escada que eu subira tão contente; E as paredes, herdeiras do passado, Que vem fallar dos mortos ao vivente. Subi e abri com lagrimas a porta Que ambos abrimos a chorar um dia; E evoquei o fantasma da ventura Que outr’ora um céu de rosas nos abria. Sentei-me á meza, onde comtigo outr’ora Em noites bellas de verão ceiava; Desses amores placidos e amenos Tudo ao meu triste coração fallava. Fui ao teu camarim, e vi-o ainda Brilhar com o esplendor das mesmas cores; E pousei meu olhar nas porcelanas Onde morriam inda algumas flores… Vi aberto o piano em que tocavas; Tua morte o deixou mudo e vasio, Como deixa o arbusto sem folhagem, Passando pelo valle, o ardente estio. Tornei a ver o teu sombrio quarto Onde estava a saudade de outros dias... Um raio illuminava o leito ao fundo Onde, rosa de amor, já não dormias. As cortinas abri que te amparavam Da luz mortiça da manhã, querida, Para que um raio depozesse um toque De prazer em tua fronte adormecida. Era alli que, depois da meia noite, Tanto amor nós sonhavamos outr’ora; E onde até o raiar da madrugada Ouvíamos bater — hora por hora! Então olhavas tu a chamma activa Correr alli no lar, como a serpente; E’ que o somno fugia de teus olhos Onde já te queimava a febre ardente. Lembras-te agora, nesse mundo novo, Dos gozos desta vida em que passaste? Ouves passar, no tumulo em que dormes, A turba dos festins que acompanhaste? A insomnia ,como um verme em flor que murcha, De continuo essas faces desbotava; E prompta para amores e banquetes Conviva e cortezã te preparava. Hoje, Maria, entre virentes flores, Dormes em doce e placido abandono; A tua alma acordou mais bella e pura, E Deus pagou-te o retardado somno. Pobre mulher! em tua ultima hora Só um homem tiveste á cabeceira; E apenas dous amigos dos de outr’ora Foram levar-te á cama derradeira. HORAS VIVAS. No Album da Exma. Sra. D. C. F. de Seixas. (1804) Noite: abrem-se as flôres... Que explendores! Cynthia sonha amores Pelo céu. Tênues os neblinas A’s campinas Descem das collinas, Como um véu. Mãos em mãos travadas, Animadas, Vão aquellas fadas Pelo ar; Soltos os cabellos, Em novellos, Puros, louros, bellos, A voar. — « Homem, nos teus dias Que agonias, Sonhos, utopias. Ambições; Vivas e fagueiras, As primeiras, Como as derradeiras Illusões! — « Quantas, quantas vidas Vão perdidas, Pombas mal feridas Pelo mal! Annos apoz annos, Tão insanos, Vem os desenganos Afinal. — « Dorme: se os pesares Repousares, Vês? — por estes ares Vamos rir; Mortas, não; festivas, E lascivas, Somos — horas vivas De dormir! — » AS ROSAS. A Caetano Filgueiras. Rosas que desabrochaes, Como os primeiros amores, Aos suaves resplendores Matinaes; Em vão ostentaes, em vão, A vossa graça suprema; De pouco vale; é o diadema Da illusão. Em vão encheis de aroma o ar da tarde; Em vão abris o seio humido e fresco Do sol nascente aos beijos amorosos; Em vão ornaes a fronte á meiga virgem; Em vão, como penhor de puro affecto, Como um élo das almas, Passaes do seio amante ao seio amante; Lá bate a hora infausta Em que é força morrer; as folhas lindas Perdem o viço da manhã primeira, As graças e o perfume. Rosas que sois então? — Restos perdidos, Folhas mortas que o tempo esquece, e espalha Brisa do inverno ou mão indifferente. Tal é o vosso destino, O’ filhas da natureza; Em que vos peze á belleza, Pereceis; Mas, não... Se a mão de um poeta Vos cultiva agora, ó rosas, Mais vivas, mais jubilosas, Floresceis. OS DOUS HORISONTES. A M. Ferreira Guimarães. (1863.) Dous horisontes fecham nossa vida: Um horisonte, — a saudade Do que não ha de voltar; Outro horisonte, — a esperança Dos tempos que hão de chegar; No presente, — sempre escuro, — Vive a alma ambiciosa Na illusão voluptuosa Do passado e do futuro. Os doces brincos da infancia Sob as azas maternaes, O vôo das andorinhas, A onda viva e os rosaes; O goso do amor, sonhado N’um olhar profundo e ardente, Tal é na hora presente O horisonte do passado. Ou ambição de grandeza Que no espirito calou, Desejo de amor sincero Que o coração não gosou; Ou um viver calmo e puro A’ alma convalescente, Tal é na hora presente O horisonte do futuro. No breve correr dos dias Sob o azul do céu, — taes são Limites no mar da vida: Saudade ou aspiração; Ao nosso espirito ardente, Na avidez do bem sonhado, Nunca o presente é passado, Nunca o futuro é presente. Que scismas, homem? — Perdido No mar das recordações, Escuto um éco sentido Das passadas illusões. Que buscas, homem? — Procuro, Atravez da immensidade, Ler a doce realidade Das illusões do futuro. Dous horisontes fecham nossa vida. MONTE ALVERNE. Ao Padre Mestre A. J. da Silveira Sarmento. (1858.) Morreu! — Assim baquêa a estatua erguida No alto do pedestal; Assim o cedro das florestas virgens Cahe pelo embate do corsel dos ventos Na hora do temporal. Morreu! — Fechou-se o portico sublime De um paço secular; Da mocidade a romaria augusta Amanhã ante as pallidas ruinas Ha de vir meditar! Tinha na fronte de propheta ungido A inspiração do céu. Pela escada do pulpito moderno Subio outr’ora festival mancebo E Bossuet desceu! Ah! que perdeste n’um só homem, claustro! Era uma augusta voz; Quando essa boca divinal se abria, Mais viva a crença dissipava n’alma Uma duvida atroz! Era tempo? — a argila se alquebrava N’um aspero crysol; Corrido o véu pelos cançados olhos Nem via o sol que lhe contava os dias, Elle — fecundo sol! A doença o prendia ao leito infausto Da derradeira dor; A terra reclamava o que era terra, E o gelo dos invernos coroava A fronte do orador. Mas lá dentro o espirito fervente Era como um fanal; Não, não dormia nesse regio craneo A alma gentil do Cicero dos pulpitos, — Cuidadosa Vestal! Era tempo! — O romeiro do deserto Pára um dia tambem; E ante a cidade que almejou por annos Desdobra um riso nos doridos labios, Descança e passa além! Cahiste! — Mas foi só a argila, o vaso, Que o tempo derrubou; Não todo á eça foi teu vulto olympico; Como deixa o cometa uma aurea cauda, A lembrança ficou! O que hoje resta era a terrena purpura Daquelle genio-rei; A alma voou ao seio do infinito, Voltou á patria das divinas glorias O apostolo da lei. Patria, curva os joelhos ante esses restos Do orador immortal! Por esses labios não fallava um homem, Era uma geração, um seculo inteiro, Grande, monumental! Morreu! — Assim baquêa a estatua erguida No alto do pedestal; Assim o cedro das florestas virgens Cahe pelo embate do corsel dos ventos Na hora do temporal! AS VENTOINHAS. (1863.) Com seus olhos vaganáus. Bons de dar, bons de tolher. Sa’ de Miranda. A mulher é um catavento, Vae ao vento, Vae ao vento que soprar; Como vae tambem ao vento Turbulento, Turbulento e incerto o mar. Sopra o sul: a ventoinha Volta azinha, Volta azinha para o sul; Vem taful: a cabecinha Volta azinha, Volta azinha ao meu taful. Quem lhe pozer confiança, De esperança, De esperança mal está; Nem desta sorte a esperança Confiança, Confiança nos dará. Valêra o mesmo na arêa Rija amêa, Rija amêa construir; Chega o mar e vae a amêa Como a arêa, Como a arêa confundir. Ouço dizer de umas fadas Que abraçadas, Que abraçadas como irmãs, Caçam almas descuidadas... Ah que fadas! Ah que fadas tão villans! Pois, como essas das balladas, Umas fadas, Umas fadas d’entre nós, Caçam, como nas balladas; E são fadas, E são fadas de alma e voz. E’ que — como o catavento, Vão ao vento, Vão ao vento que lhes der; Cedem tres cousas ao vento: Catavento, Catavento, agua e mulher. ALPUJARRA. (Miçkiewicz. — 1862.) Jaz em ruinas o torrão dos mouros; Pesados ferros o infeliz arrasta; Inda resiste a intrepida Granada; Mas em Granada a peste assola os povos. C’um punhado de heroes sustenta a luta Fero Almansor nas torres de Alpujarra; Fluctua perto a hispanica bandeira; Hade o sol d’amanhã guiar o assalto. Deu signal, ao romper do dia, o bronze; Arrasam-se trincheiras e muralhas; No alto dos minarets erguem-se as cruzes; Do castelhano a cidadella é presa. Só, e vendo as cohortes destroçadas, O valente Almansor apoz a luta Abre caminho entre as imigas lanças, Foge e illude os christãos que o perseguiam. Sobre as quentes ruinas do castello, Entre corpos e restos da batalha, Dá um banquete o Castelhano, e as presas E os despojos pelos seus reparte. Eis que o guarda da porta falla aos chefes: « Um cavalleiro, diz, de terra estranha Quer fallar-vos; — noticias importantes Declara que voz traz, e urgencia pede. » Era Almansor, o emir dos Musulmanos, Que, fugindo ao refugio que buscára, Vem entregar-se ás mãos do castelhano, A quem só pede conservar a vida. « Castelhanos, exclama, o emir vencido No limiar do vencedor se prostra; Vem professar a vossa fé e culto E crer no verbo dos prophetas vossos. « Espalhe a fama pela terra toda Que um arabe, que um chefe de valentes, Irmão dos vencedores quiz tornar-se, E vassallo ficar de estranho sceptro! » Cala no animo nobre ao Castelhano Um acto nobre... O chefe commovido, Corre a abraçal-o, e á sua vez os outros Fazem o mesmo ao novo companheiro. A’s saudações responde o emir valente Com saudações. Em cordial abraço Aperta ao seio o commovido chefe, Toma-lhe das mãos e pende-lhe dos labios. Subito cahe, sem forças, nos joelhos; Arranca do turbante, e com mão tremula O enrola aos pés do chefe admirado, E junto delle arrasta-se por terra. Os olhos volve em torno e assombra a todos: Tinha azuladas, lividas as faces, Torcidos labios por feroz sorriso, Injectados de sangue avidos olhos. « Desfigurado e pallido me vêdes, O’ infieis! Sabeis o que vos trago? Enganei-vos: eu volto de Granada, E a peste fulminante aqui vos trouxe. » Ria-se ainda — morto já — e ainda Abertos tinha as palpebras e os labios; Um sorriso infernal de escarneo impresso Deixara a morte nas feições do morto. Da medonha cidade os castelhanos Fogem. A peste os segue. Antes que a custo Deixado houvessem de Alpujarra a serra, Succumbiram os ultimos soldados. VERSOS A CORINNA. Tacendo il nome di questa gentilissima. Dante. (1864). I. Car la beauté tue Qui l’a vue, Elle enivre et tue. A. Briseux. Tu nasceste de um beijo e de um olhar. O beijo N’uma hora de amor, de ternura e desejo, Uniu a terra e o céu. O olhar foi do Senhor, Olhar de vida, olhar de graça, olhar de amor; Depois, depois vestindo a fórma peregrina, Aos meus olhos mortaes, surgiste-me, Corinna! De um jubilo divino os cantos entoava A natureza mãi, e tudo palpitava, A flor aberta e fresca, a pedra bronca e rude, De uma vida melhor e nova juventude. Minh’alma adivinhou a origem do teu ser; Quiz cantar e sentir; quiz amar e viver; A’ luz que de ti vinha, ardente, viva, pura, Palpitou, reviveu a pobre creatura; Do amor grande, elevado, abriram-se-lhe as fontes; Fulgiram novos sões, rasgaram-se horisontes; Surgiu, abrindo em flor, uma nova região; Era o dia marcado á minha redempção. Era assim que eu sonhava a mulher. Era assim: Corpo de fascinar, alma de cherubim; Era assim: fronte altiva e gesto soberano, Um porte de rainha a um tempo meigo e ufano, Em olhos senhoris uma luz tão serena, E grave como Juno, e bella como Helena! Era assim, a mulher que extasia e domina, A mulher que reune a terra e o céu: Corinna! Neste fundo sentir, nesta fascinação, Que pede do poeta o amante coração? Viver como nasceste, ó belleza, ó primor, De uma fusão do ser, de uma effusão do amor. Viver, — fundir a existencia Em um osculo de amor, Fazer de ambas — uma essencia, Apagar outras lembranças, Perder outras illusões, E ter por sonho melhor O sonho das esperanças De que a unica ventura Não reside em outra vida, Não vem de outra creatura; Confundir olhos nos olhos, Unir um seio a outro seio, Derramar as mesmas lagrimas E tremer do mesmo enleio, Ter o mesmo coração, Viver um do outro viver... Tal era a minha ambição. Donde viria a ventura Desta vida? Em que jardim Colheria esta flor pura? Em que solitaria fonte Esta agua iria beber? Em que encendido horisonte Podiam meus olhos ver Tão meiga, tão viva estrella, Abrir-se e resplandecer? Só em ti: — em ti que és bella, Em ti que a paixão respiras, Em ti cujo olhar se embebe Na illusão de que deliras, Em ti, que um osculo de Hebe Teve a singular virtude De encher, de animar teus dias, De vida e de juventude.... Amemos! diz a flor á brisa peregrina, Amemos! diz a brisa, arfando em torno á flor; Cantemos esta lei e vivamos, Corinna, De uma fusão do ser, de uma effusão do amor. II. Mon pauvre coeur, reprends ton sublime courage Et me chantes ta joie et ton déchirement. — A. Houssaye. A minha alma, talvez, não é tão pura, Como era pura nos primeiros dias; Eu sei: tive choradas agonias De que conservo alguma nodoa escura, Talvez. Apenas á manhã da vida Abri meus olhos virgens e minha alma, Nunca mais respirei a paz e a calma, E me perdi na porfiosa lida. Não sei que fogo interno me impellia A’ conquista da luz, do amor, do gozo, Não sei que movimento imperioso De um desusado ardor minha alma enchia. Corri de campo em campo e plaga em plaga. (Tanta anciedade o coração encerra!) A ver o lyrio que brotasse a terra, A ver a escuma que cuspisse — a vaga. Mas, no areal da praia, no horto agreste, Tudo aos meus olhos avidos fugia….. Desci ao chão do valle que se abria, Subi ao cume da montanha alpéstre. Nada! Volvi o olhar ao céu. Perdi-me Em meus sonhos de moço e de poeta; E contemplei, nesta ambição inquieta, Da muda noite a pagina sublime. Tomei nas mãos a cythara saudosa, E soltei entre lagrimas um canto... A terra brava recebeu meu pranto E o éco repetiu-me a voz chorosa. Foi em vão. Como um languido suspiro, A voz se me calou, e do invio monte Olhei ainda as linhas do horisonte, Como se olhasse o ultimo retiro. Nuvem negra e veloz corria solta O anjo da tempestade annunciando; Vi ao longe as alcyones cantando Doidas correndo á flor da agua revolta. Desilludido, exhausto, ermo, perdido, Busquei a triste estancia do abandono, E esperei, aguardando o ultimo somno, Volver á terra, de que foi nascido. — « O’ Cybele fecunda, é no remanso Do teu seio — que vive a creatura; Chamem-te outros morada triste e escura, Chamo-te gloria, chamo-te descanso! » Assim fallei. E murmurando aos ventos Uma blasphemia atroz — estreito abraço Homem e terra uniu, e em longo espaço Aos écos repeti meus vãos lamentos. Mas, tu passaste... Houve um grito Dentro de mim. Aos meus olhos Visão de amor infinito, Visão de perpetuo gozo Perpassava c me attrahia, Como um sonho voluptuoso De sequiosa fantasia. Ergui-me logo do chão, E pousei meus olhos fundos Em teus olhos soberanos, Ardentes, vivos, profundos, Como os olhos da belleza Que das escumas nasceu... Eras tu, maga visão Eras tu o ideal sonhado Que em toda a parte busquei, E por quem houvera dado A vida que fatiguei; Por quem verti tanto pranto, Por quem nos longos espinhos Minhas mãos, meus pés sangrei! Mas se minh’alma, acaso, é menos pura Do que era pura nos primeiros dias, Porque não soube em tantas agonias Abençoar a minha desventura; Se a blasphemia os meus labios polluira, Quando, depois do tempo e do cansaço, Beijei a terra no mortal abraço E espedacei desanimado a lyra; Podes, visão formosa e peregrina, No amor profundo, na existencia calma, Desse passado resgatar minh'alma E levantar-me aos olhos teus, — Corinna! III. Se tu podesses viver um dia na minh’alma.... feliz creatura, tu saberias o que é soffrer! Miçkiewicz. — Sonetos da Criméa. Quando voarem minhas esperanças, Como um bando de pombas fugitivas; E destas illusões doces e vivas Só me restarem pallidas lembranças; E abandonar-me a minha mãe Chimera, Que me aleitou aos seios abundantes; E vierem as nuvens flammejantes Encher o céu da minha primavera; E raiar para mim um triste dia, Em que, por completar minha tristeza, Nem possa ver-te, musa da belleza, Nem possa ouvir-te, musa da harmonia; Quando assim seja, por teus olhos juro, Voto minh’alma á escura soledade, Sem procurar melhor felicidade, E sem ambicionar prazer mais puro. Como o viajor que, da fallaz miragem Volta desenganado ao lar tranquillo, E procura, naquelle ultimo asylo, Nem evocar memorias da viagem; Envolvido em mim mesmo, olhos cerrados A tudo mais, — a minha fantasia As azas colherá com que algum dia Quiz alcançar os cimos elevados. E’s tu a maior gloria de minha alma, Se o meu amor profundo não te alcança, De que me servirá outra esperança? Que gloria tirarei de alheia palma? Que valem glorias vãs? A gloria, a melhor gloria, E’ esta que nos orna a poesia da historia; E' a gloria do céu, é a gloria do amor. E’ Tasso eternisando a princeza Leonor; E’ Lydia ornando a lyra ao venusino Horacio; E’ a doce Beatriz, flor e honra do Lacio, Seguindo além da vida as viagens do Dante; E’ do cantor do Gama o hymno triste e amante Levando á eternidade o amor de Catharina; E’ o amor que une Ovidio á formosa Corinna; O de Cynthia a Propercio, o de Lesbia a Catullo; O da divina Delia ao divino Tibullo. Esta a gloria que fica, eleva, honra e consola; Outra não ha melhor. Se faltar esta esmola, Corinna, ao teu poeta, e se a doce illusão, Com que se alenta e vive o amante coração, Deixar-lhe um dia o céu tão azul, tão tranquillo, Nenhuma gloria mais ha de nunca attrahil-o. Irá longe do mundo e dos seus vãos prazeres, Viver na solidão a vida de outros seres, Vegetar como o arbusto, e murchar, como a flor, Como um corpo sem alma ou alma sem amor. Ah! faze que estas illusões tão vivas Nunca se tornem pallidas lembranças; E nem voem as minhas esperanças Como um bando de pombas fugitivas! IV. Ne vois-tu pas? A. M. Tu que és bella e feliz, tu que tens por diadema A dupla irradiação da belleza e do amor; E sabes reunir, como o melhor poema, Um desejo da terra e um toque do Senhor; Tu, creação feliz de um dia de pureza, Em que a terra não teve um só peccado, irmã Das visões que sonhou no culto da belleza A musa de Petrarca e o pincel de Rembrant; Tu que, como a illusão, entre nevoas deslisas Aos versos do poeta um desvellado olhar, Corinna, ouve a canção das amorosas brisas, Do poeta e da luz, das selvas e do mar. AS BRISAS. Deu-nos a harpa eolia a excelsa melodia Que a folhagem desperta e torna alegre a flor, Mas que vale esta voz, ó musa da harmonia, Ao pé da tua voz, filha da harpa do amor? Diz-nos tu como houveste as notas do teu canto? Que alma de serafim volteia aos labios teus? Donde houveste o segredo e o poderoso encanto Que abre a ouvidos mortaes a harmonia dos céus? A LUZ. Eu sou a luz fecunda, alma da natureza; Sou o vivo alimento á viva creação. Deus lançou-me no espaço. A minha realeza Vae até onde vae meu vivido clarão. Mas se derramo vida a Cybelle fecunda, Que sou eu ante a luz dos teus olhos? Melhor, A tua é mais do céu, mais doce, mais profunda, Se a vida vem de mim, tu dás a vida e o amor. AS AGUAS. Do nume da belleza o berço celebrado. Foi o mar. Venus bella entre espumas nasceu. Veio a idade de ferro, e o nume venerado Do venerado altar baqueou: — pereceu. Mas a belleza és tu. Como Venus marinha, Tens a ineffavel graça e o ineffavel ardor. Se paras, és um nume; andas, uma rainha, E se quebras um olhar, és tudo isso e és amor! Chamam-te as aguas, vem! tu irás sobre a vaga A vaga, a lua mãe, que te abre os seios nús, Buscar adorações de uma plaga a outra plaga, E das regiões da nevoa ás regiões da luz! AS SELVAS. Um silencio de morte entrou no seio ás selvas. Já não pisa Diana este sagrado chão; Nem já vem repousar no leito destas relvas Aguardando saudosa o amor e Endymião. Da grande caçadora a um solicito aceno Já não vem, não acode o grupo jovial; Nem o éco repete a flauta de Sileno, Apoz o grande ruido a mudez sepulchral. Mas Diana apparece. A floresta palpita, Uma seiva melhor circula mais veloz; E’ vida que renasce, é vida que se agita; A’ luz do teu olhar, ao som da tua voz! O POETA. Tambem eu, sonhador, que vi correr meus dias Na solemne mudez da grande solidão, E soltei, enterrando as minhas utopias, O ultimo suspiro e a ultima oração; Tambem eu junto a voz á voz da natureza, E soltando o meu hymno ardente e triumphal, Beijarei ajoelhado as plantas da belleza E banharei minh’alma em tua luz, — Ideal! Ouviste a natureza? A’s supplicas e ás maguas Tua alma de mulher deve de palpitar; Mas que te não seduza o cântico das aguas, Não procures, Corinna, o caminho do mar! V. Povero mio core! Ecco una separazione di piú nella mia scigurata vita! Silvio Pellico. Guarda estes versos que escrevi chorando Como um alivio á minha soledade, Como um dever do meu amor; e quando Houver em ti um éco de saudade, Beija estes versos que escrevi chorando. Unico em meio das paixões vulgares, Fui a teus pés queimar minh’alma anciosa, Como se queima o oleo ante os altares; Tive a paixão indomita e fogosa, Unica em meio das paixões vulgares. Cheio de amor, vasio de esperança, Dei para ti os meus primeiros passos; Minha illusão fez-me, talvez, criança; E eu pretendi dormir aos teus abraços, Cheio de amor, vasio de esperança. Refugiado á sombra do mysterio Pude cantar meu hymno doloroso; E o mundo ouvio o som doce ou funereo Sem conhecer o coração ancioso Refugiado á sombra do mysterio. Mas eu que posso contra a sorte esquiva? Vejo que em teus olhares de princeza Transluz uma alma ardente e compassiva Capaz de reanimar minha incerteza; Mas eu que posso contra a sorte esquiva? Como um réo indefeso e abandonado, Fatalidade, curvo-me ao teu gesto; E se a perseguição me tem cansado, Embora, escutarei o teu aresto Como um réo indefeso e abandonado. Embora fujas aos meus olhos tristes, Minh’alma irá saudosa, enamorada, Acercar-se de ti lá onde existes; Ouvirás minha lyra apaixonada, Embora fujas aos meus olhos tristes. Talvez um dia meu amor se extinga, Como fogo de Vesta mal cuidado Que sem o zelo da Vestal não vinga; Na ausencia e no silencio condemnado Talvez um dia meu amor se extinga. Então não busques reavivar a chamma; Evoca apenas a lembrança casta Do fundo amor daquelle que não ama; Esta consolação apenas basta; Então não busques reavivar a chamma. Guarda estes versos que escrevi chorando Como um alivio á minha soledade, Como um dever do meu amor; e quando Houver em ti um éco de saudade, Beija estes versos que escrevi chorando. VI. O amor tem azas, mas elle tambem póde dal-as. Homero. Em vão! Contrario a amor é nullo o esforço humano; E’ nullo o vasto espaço, é nullo o vasto oceano. Solta do chão, abrindo as azas luminosas, Minh’alma se ergue e vôa ás regiões venturosas, Onde ao teu brando olhar, ó formosa Corinna, Reveste a natureza a purpura divina! Lá, como quando volta a primavera em flor, Tudo sorri de luz, tudo sorri de amor; Ao influxo celeste e doce da belleza, Pulsa, canta, irradia e vive a natureza; Mais languida e mais bella a tarde pensativa Desce do monte ao valle; e a viração lasciva Vai despertar á noite a melodia extranha Que fallam entre si os olmos da montanha; A flor tem mais perfume e a noite mais poesia; O mar tem novos sons e mais viva ardentia; A onda enamorada arfa e beija as arêas, Novo sangue circula, ó terra, em tuas veias! O esplendor da belleza é raio creador: Derrama a tudo a luz, derrama a tudo o amor. Mas vê. Se o que te cerca é uma festa de vida, Eu, tão longe de ti, sinto a dor mal soffrida Da saudade que punge e do amor que lacera, E palpita e soluça e sangra e desespera. Sinto em torno de mim a muda natureza Respirando, como eu, a saudade e a tristeza; A saudade do bem e a tristeza do mal; Tristeza sem irmã, saudade sem igual. E’ deste ermo que eu vou, alma desventurada, Murmurar junto a ti a estrophe immaculada Do amor que não perdeu, co’a ultima esperança, Nem o intenso fervor, nem a intensa lembrança. Sabes se te eu amei, sabes se te amo ainda, Do meu sombrio céu alva estrella bemvinda! Como divaga a abelha inquieta e sequiosa Do calice do lyrio ao calice da rosa, Divaguei de alma em alma em busca deste amor; Gota de mel divino, era divina a flor Que o devia conter. Eras tu. No delirio De te amar — olvidei as lutas e o martyrio; Eras tu. Eu só quiz, n’uma ventura calma, Sentir e ver o amor atravez de uma alma; De outras bellezas vans não valeu o esplendor, A belleza eras tu: — tinhas a alma e o amor. Pelicano do amor, dilacerei meu peito, E com meu proprio sangue os filhos meus aleito; Meus filhos: o desejo, a chimera, a esperança; Por elles reparti minh’alma. Na provança Ella não fraqueou, antes surgio mais forte; E’ que eu puz neste amor, neste ultimo transporte Tudo o que vivifica a minha juventude: O culto da verdade e o culto da virtude, A venia do passado e a ambição do futuro, O que ha de grande e bello, o que ha de nobre e puro. Deste profundo amor, doce e amada Corinna, Acorda-té a lembrança um éco de afflicção? Minh’alma pena e chora á dôr que a desatina: Sente tu'alma acaso a mesma commoção? Em vão! Contrario a amor é nullo o esforço humano, E’ nullo o vasto espaço, é nullo o vasto oceano! Vou, sequioso espirito, Cobrando novo alento, N'aza veloz do vento Correr de mar em mar; Posso, fugindo ao carcere, Que á terra me tem prezo, Em novo ardor aceso, Voar, voar, voar! Então, se á hora languida Da tarde que declina, Do arbusto da collina Beijando a folha e a flor, A brisa melancolica Levar-te entre perfumes Uns timidos queixumes Echos de magua e dôr; Então, se o arroio timido Que arrasta-se e murmura A’ sombra da espessura Dos verdes salgueiraes, Mandar-te entre os murmurios Que solta nos seus giros, Uns como que suspiros D’amor, uns ternos ais; Então, se no silencio Da noite adormecida, Sentires — mal dormida — Em sonho ou em visão, Um beijo em tuas palpebras, E’ que eu puz neste amor, neste ultimo transporte Tudo o que vivifica a minha juventude: O culto da verdade e o culto da virtude, A venia do passado e a ambição do futuro, O que ha de grande e bello, o que ha de nobre e puro. Deste profundo amor, doce e amada Corinna, Acorda-té a lembrança um éco de afflicção? Minh’alma pena e chora á dôr que a desatina: Sente tu’alma acaso a mesma commoção? Em vão! Contrario a amor é nullo o esforço humano, E’ nullo o vasto espaço, é nullo o vasto oceano! Vou, sequioso espirito, Cobrando novo alento, N’aza veloz do vento Correr de mar em mar; Posso, fugindo ao carcere, Que á terra me tem prezo, Em novo ardor aceso, Voar, voar, voar! Então, se á hora languida Da tarde que declina, Do arbusto da collina Beijando a folha e a flor, A brisa melancolica Levar-te entre perfumes Uns timidos queixumes Echos de magua e dôr; Então, se o arroio timido Que arrasta-se e murmura A’ sombra da espessura Dos verdes salgueiraes, Mandar-te entre os murmurios Que solta nos seus giros, Uns como que suspiros D’amor, uns ternos ais; Então, se no silencio Da noite adormecida, Sentires — mal dormida — Em sonho ou em visão, Um beijo em tuas palpebras, Um nome aos teus ouvidos, E ao som de uns ais partidos Pulsar teu coração; Da magoa que consome O meu amor venceu; Não tremas — é teu nome, Não fujas — que sou eu! — FIM DOS VERSOS A CORINNA. ULTIMA FOLHA. Tout passe, Tout fuit. V. Hugo. Musa, desce do alto da montanha Onde aspiraste o aroma da poesia, E deixa ao éco dos sagrados ermos A ultima harmonia. Dos teus cabellos de ouro, que beijavam Na amena tarde as virações perdidas, Deixa cahir ao chão as alvas rosas E as alvas margaridas. Vês? Náo é noite, não, este ar sombrio Que nos esconde o céu. Inda no poente Não quebra os raios pallidos e frios O sol resplandecente. Vês? Lá ao fundo o valle arido e secco Abre-se, como um leito mortuario; Espera-te o silencio da planicie, Como um frio sudario. Desce. Virá um dia em que mais bella, Mais alegre, mais cheia de harmonias, Voltes a procurar a voz cadente Dos teus primeiros dias. Então coroarás a ingenua fronte Das flores da manhã, — e ao monte agreste, Como a noiva phantastica dos ermos, Irás, musa celeste! Então, nas horas solemnes Em que o mystico bymeneu Une em abraço divino Verde a terra, azul o céu; Quando, já finda a tormenta Que a natureza enluctou, Bafeja a brisa suave Cedros que o vento abalou; E o rio, a arvore e o campo, A arêa, a face do mar, Parecem, como um concerto, Palpitar, sorrir, orar; Então sim, alma de poeta, Nos teus sonhos cantarás A gloria da natureza, A ventura, o amor e a paz! Ah! mas então será mais alto ainda; Lá onde a alma do vate Possa escutar os anjos, E onde não chegue o vão rumor dos homens; Lá onde, abrindo as asas ambiciosas, Possa adejar no espaço luminoso, Viver de luz mais viva e de ar mais puro, Fartar-se do infinito! Musa, desce do alto da montanha Onde aspiraste o aroma da poesia, E deixa ao éco dos sagrados ermos A ultima harmonia! FIM. POST-FACIO. (Carta ao Dr. Caetano Filgueiras). Meu amigo. Agora que o leitor frio e severo pôde comparar o meu pobre livro com a tua critica benevola e amiga, deixa-me dizer-te rapidamente duas palavras. Recordaste os nossos amigos, poetas na adolescencia, hoje idos para sempre dos nossos olhos e da gloria que os esperava. Tão piedosa evocação será o palladium do meu livro, como o é a tua carta de recommendação. Vae longe esse tempo. Guardo a lembrança delle, tão viva como a saudade que ainda sinto, mas já sem aquellas illusões que o tornavam tão doce ao nosso espirito. O tempo não corre em vão para os que desde o berço foram condemnados ao duelo infausto entre a aspiração e a realidade. Cada anno foi uma lufada que desprendeu da arvore da mocidade, não só uma alma querida, como uma illusão consoladora. A tua penna encontrou espressões de verdade e de sentimento para descrever as nossas confabulações de poetas, tão serenas e tão intimas. Tiveste o condão de transportar-me a essas praticas da adolescencia poetica; lendo a tua carta pareceu-me ouvir aquelles que hoje repousam nos seus tumulos; e ouvindo dentro de mim um ruido de applauso sincero ás tuas expressões, affigurava-se-me que eram elles que te applaudiam, como no outro tempo, na tua pequena e faceira salinha. Essa recordação bastava para felicitar o meu livro. Mas onde não vae a amisade e a critica benevolente? Foste além: — traduziste para o papel as tuas impressões que eu, — mesmo despido desta modestia official dos preambulos e dos epilogos, — não posso deixar de acceitar como parciaes e filhas do coração. Bem sabes como o coração póde levar a injustiças involuntarias, apezar de todo o empenho em manter uma imparcialidade perfeita. Não, o meu livro não vae aparecer como o resultado de uma vocação superior. Confesso o que me falta que é para ter direito de reclamar o pouco que possuo. O meu livro é esse pouco que tu caracterisaste tão bem attribuindo os meus versos a um desejo secreto de expansão; não curo de escolas ou theorias; no culto das musas não sou um sacerdote, sou um fiel obscuro da vasta multidão dos fieis. Tal sou eu, tal deve ser apreciado o meu livro; nem mais, nem menos. Foi assim que eu cultivei a poesia. Se commetti um erro, tenho cumplices, tu e tantos outros, mortos, e ainda vivos. Animaram-me,e bem sabes o que vale uma animação para os infantes da poesia. Muitas vezes é a sua perdição. Sêl-a-hia para mim? O publico que responda. Não inclui neste volume todos os meus versos. Faltou-me o tempo para colligir e corrigir muitos delles, filhos das primeiras incertezas. Vão porem todos, ou quasi todos os versos de recente data. Se um escrupulo de não accumular muita cousa sem valor me não detivesse, este primeiro volume sahiria menos magro do que é; entre os dois inconvenientes preferi o segundo. Como sabes, publicando os meus versos cedo ás sollicitações de alguns amigos, a cuja frente te pozeste. Devo declaral-o, para que não recaia sobre mim exclusivamente a responsabilidade do livro. Denuncio os cumplices para que soffram a sentença. Não te bastou animar-me a realisar esta publicação; a tua lealdade quiz que tomasses parte no commettimento, e com a tua própria firma sellaste a tua confissão. Agradeço-te o acto e o modo por que o praticaste. E se a tua bella carta não puder salvar o meu livro de um insucesso fatal, nem por isso deixarei de extender-te amigavel e fraternalmente a mão. Machado de Assis. Rio de Janeiro, lº de Septembro de 1864. NOTAS. O diluvio. — Pag. 31. E ao som dos nossos canticos; etc. (Pag. 34). Estes versos são postos na boca de uma hebrea. Foram recitados no Atheneu Dramatico pela eminente artista D. Gabriella da Cunha, por occasião da exhibição de um quadro do scenographo João Caetano, representando o diluvio universal. A joven capitiva. — Pag. 43. Foi com alguma hesitação que eu fiz inserir no volume estes versos. Já bastava o arrojo de traduzir a maviosa elegia de Chenier. Poderia eu conservar a grave simplicidade do original? A animação de um amigo decidio-me a não immolar o trabalho já feito; ahi fica a poesia; se me sahir mal, corre por conta do amigo anonymo. Embirração. — Pag. 71. Esta poesia, como se terá visto, é a resposta que me deu o meu amigo F. X. de Novaes, a quem foram dirigidos os versos anteriores. Tão bom amigo e tão bello nome tinham direito de figurar neste livro. O leitor apreciará, sem duvida, a difliculdade vencida pelo poeta que me respondeu em estylo faceto, no mesmo tom e pelos mesmos consoantes. Cleopatra. — Pag. 75. Este canto é tirado de uma tragédia de M.me Emile de Girardin. O escravo, tendo visto coroado o seu amor pela rainha do Egypto, é condemnado a morrer. Com a taça em punho, entoa o bello canto de que fiz esta mal amanhada paraphrase. Os arlequins. — Pag. 81. Esta poesia foi recitada no Club Fluminense, n’um saráo litterario. Pareceu então que eu fazia satyra pessoal. Não fiz. A satyra abrange uma classe que se encontra em todas as scenas politicas, — é a classe daquelles que, como se exprime um escriptor, depois de darem ao povo todas as insignias da realeza, quizeram completar-lh’a; fazendo-se elles proprios os bobos do povo. Polonia. — Pag. 89. Eras livre, tão livre como as aguas Do teu formoso, celebrado rio. (Pag. 90). O rio a que alludem os versos é o Niemen. E’ um dos rios mais cantados pelos poetas polacos. Ha um soneto de Miçkiewicz ao Niemen, que me agradou muito, apezar da prosa franceza em que o li, e do qual escreve um critico polaco: « Ha nesta pagina uma cantilena a que não resiste nenhum ouvido slavo; foi posta em musica pelo celebre Kurpinski. Assim consagrado, o soneto do Niemen correu toda a Polonia, e só deixará de viver quando deixarem de correr as aguas daquelle rio. » Foi a hora dos hymnos e das preces. (Pag. 93). Allude ás scenas da Varsovia, em que este admiravel povo ia aos templos cantar ladainhas sobre a musica dos hymnos nacionaes, a despeito da invasão da tropa armada nas igrejas. E’ sabido que por esse motivo se fecharam os templos. Maria Duplessis. — Pag. 97. Em 1858, eu e o meu finado amigo F. Gonsalves Braga resolvemos fazer uma traducção livre ou paraphrase destes versos de Alexandre Dumas filho. No dia aprazado apresentamos e confrontamos o nosso trabalho. A traducção delle foi publicada, não me lembro em que jornal. As rosas. — Pag. 105. ………….Se a mão de um poeta Vos cultiva agora, ó rosas, etc. O Dr. Caetano Filgueiras trabalha ha tempos n’um livro de que são as rosas o titulo e o objecto. E’ um trabalho curioso de erudicção e de phantasia; o assumpto requer, na verdade, um poeta e um erudicto. E’ a isso que alludem estes ultimos versos. Monte Alverne. — Pag. 111. A dedicatoria desta poesia ao padre-mestre Silveira Sarmento é um justo tributo pago ao talento, e á amizade que sempre me votou este digno sacerdote. Pareceu-me que não podia fazer nada mais proprio do que fallar-lhe de Monte Alverne, que elle admirava, como eu. Não ha nesta poesia só um tributo de amizade e de admiração: ha igualmente a lembrança de um anno de minha vida. O padre-mestre, alguns annos mais velho do que eu, fazia-se nesse tempo um modesto preceptor e um agradavel companheiro. Circumstancias da vida nos separaram até hoje. Alpujarra. — Pag. 119. Este canto é extrahido de um poema do poeta polaco Miçkiewicz, denominado Conrado Wallenrod. Não sei como corresponderá ao original; eu servi-me da traducção franceza do polaco Chrisliano Ostrowski. Versos a Corinna. — Pag. 123. As tres primeiras poesias desta collecção foram publicadas sob o anonymo nas columnas do Correio Mercantil; a quarta e quinta sahiram no Diario do Rio, sendo esta ultima assignada. A sexta é inteiramente inedicta. ERRATA. Pag. 10. (3ª linha). Em vez de: era trefego, etc. Lêa-se : era travesso, etc. Pag. 19. (2ª linha). Em vez de: — mais inspirado, e talvez, etc. Lêa-se: — mais inspirado, talvez, e (9º linha). Em vez de: O bioco de uma, etc. Lêa-se: O bico de uma, etc. Pag. 4. Em vez de: Uma serena graça, uma graça, dos césu, Lêa-se: Uma serena graça, uma graça dos céus, Pag. 42. Em vez de: Dando-lhes leito e pão, guarida e amor. Lêa-se: Dando-lhes pão, guarida, amparo, leito e amor. Pag. 62. Em vez de: Toda se desfolha sobre o chão da morte, Lêa-se: Toda se esfolha sobre o chão de morte, Pag. 75. Em vez de: Nome feroz de inclemencia, Lêa-se: Nume feroz de inclemencia, Pag. 77. Em vez de: O’ Venus, ó intimo peito, Lêa-se: O’ Venus, o intimo peito, Pag. 114. Em vez de: Patria curva os joelhos ante esses restos Lêa-se: Patria, curva o joelho ante esses restos Pag. 116. Em vez de: Como a arêa Como a arêa confundir. Lêa-se: Com a arêa Com a arêa confundir. Pag. 119. Em vez de: Pesados ferros o infeliz arrasta; Lêa-se: Pesados ferros o infiel arrasta; Pag. 121. Em vez de: Toma-lhe das mãos e pende-lhe dos labios. Lêa-se :Toma-lhe as mãos e pende-lhe dos labios. INDICE. Prefacio 7 Musa consolalrix. 21 Stella 23 Lucia 27 Diluvio 31 Visio 35 Fé 39 A Caridade 41 A joven captiva 43 No limiar 47 Quinze annos 51 Sinhá 55 Erro 57 Ludovina Moutinho 59 Aspiração 65 Embirração (ao autor) 71 Cleopatra 75 Os arlequins 81 Epitaphio do Mexico 87 Polonia 89 As ondinas 95 Maria Dupplessis 97 Horas vivas 101 As rosas 103 Os dous horisontes 107 Monte Alverne 111 As ventoinhas 115 Alpujarra 119 VERSOS A CORINNA: I 125 II 129 III 135 IV 139 V 146 VI 149 Ultima folha 155 Post-facio 159 Notas 165 Errata 1 173 Typ.de Quirino e Irmão r. d'Assemblea, 54.